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O Abismo Brasileiro Entre Brancos e Negros [Arquivo 2008]


A diferença entre o número de brancos e negros na população brasileira diminuiu entre os anos de 1996 e 2006 , segundo o estudo Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça , divulgado [...] pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Se em 1996 o total de brancos correspondia a 55,2% (85.261.961) da população e o de negros a 44,7% (68.929.113) , em 2006 , o total passou a ser de 49,7% (93.096.286) de brancos , frente a 49,5% (92.689.972) de negros. A representante do Fundo das Nações Unidas Para as Mulheres (UNIFEM) Maria Inês Barbosa acredita que o crescimento da população negra não tem a ver apenas com o crescimento demográfico do país e, sim, com a melhoria na autoestima dessa parcela da população. "Desde a década de 80, houve uma reafirmação da identidade negra. Isso provocou uma mudança entre as pessoas que antes se consideravam pardas e, agora , se assumem negras", afirmou. [...] Se no total da população há equilíbrio entre negros e brancos, as desigualdades em relação à educação ainda permanecem. Brancos e negros estão próximos quando analisada a inclusão no ensino fundamental. Em 2006 , 95,7% das crianças brancas cursavam os primeiros anos da escola. Já entre as negras, esse índice era de 94.2% . Entretanto, na análise sobre a inclusão no ensino médio, as diferenças se ampliam. São 58,4% de brancos e 37,4% de negros. O pesquisador do IPEA, Jorge Abrahão, afirma que o crescimento econômico não provoca diminuição da desigualdade entre negros e brancos. "As desigualdades não diminuem tão rapidamente quanto o crescimento do país porque as políticas públicas fazem recorte por renda e não por gênero ou raça", disse. "Fora isso, a renda pode aumentar , mas se está relacionada a fatores como escolaridade, e esse conjunto da população não alcança esse fatores , ele não atinge a renda ", completou Abrahão.

-Richard , IVAN , Jungmann, Mariana. População de negros e brancos quase se iguala , mas desigualdades continuam, diz Ipea. Agência Brasil, 10 set. 2008. Disponível em :< www.socialismo.org.br/portal/identidades-racismo>. Acesso em :28 out. 2009. 

Ser ou não "doutor" , andar a pé ou de carro, morar num palacete ou num barraco, ser branco ou negro no Brasil : os dados aqui apresentados demonstraram algumas das várias manifestações das desigualdades existentes em nossa sociedade. Saiba das relações entre desses assuntos.


A Condição Operária Na Fábrica Taylorista


"Na minha vida de fábrica , foi um experiência única. [...] para mim pessoalmente , veja o que significou o trabalho na fábrica . Mostrou que todos os motivos exteriores (que antes julgava interiores) sobre os quais , para mim, se apoiava o sentimento de dignidade , o respeito por mim mesma , em duas ou três semanas ficaram radicalmente arrasados pelo golpe de uma pressão brutal e cotidiana. E não creio que tenham nascido em mim sentimentos de revolta. Não, muito ao contrário. Veio o que era a última coisa do mundo que eu esperava de mim: a docilidade. Uma docilidade de besta de carga resignada. Parecia que eu tinha nascido para esperar, para perceber , para executar ordens- que nunca tinha feito senão isso - que nunca mais faria outra coisa. Não tenho orgulho de confessar isso. É a espécie de sofrimento que nenhum operário fala; dói demais, só de pensar. [...] Dois fatores condicionam esta escravidão: a rapidez e as ordens. A rapidez: para alcançá-la, é preciso repetir movimento atrás de movimento , numa cadência que, por ser mais rápida que o pensamento, impede o livre curso da reflexão e ate do devaneio. Chegando-se à frente da máquina , é preciso matar a alma , oito horas por dia , pensamentos, sentimentos, tudo. [...] As ordens : desde o momento em que se bate o cartão na entrada até aquele em que se bate o cartão na saída, elas podem ser dadas , a qualquer momento, de qualquer teor. E é preciso sempre calar e obedecer. A ordem pode ser difícil ou perigosa de se executar , até inexequível ; ou então, dois chefes dando ordens contraditórios; não faz mal : calar-se e dobrar-se [...] Engolir nossos próprios acessos de envenenamento e de mau humor ; nenhuma tradução deles em palavras , nem em gestos , pois os gestos estão determinados,  minuto a minuto , pelo trabalho. Esta situação faz com que o pensamento se dobre sobre si, se retraia , como a carne se retrai debaixo de um bisturi. Não se pode ser "consciente".

-Weil, Simone. Carta a Albetine Thévenon (1934-5). In: Bosi, Ecléa (org.). A condição operária e outros estudos sobre a opressão. Rio de Janeiro: Paz e Terra , 1979. P. 65.


Os "Ratos" e os "Queijos"!



"Antigamente , lá em Minas , a política era coisa séria. Havia dois partidos com nome registrado , programa de governo e tudo mais. Mas não era isso que entusiasmava os eleitores. Eles são sabiam direito o nome do seu partido nem se interessavam pelo programa de governo. O que fazia o sangue ferver era o nome do bicho e correlatos por que seu partido era conhecido. Em Lavras, os partidos eram os "Gaviões" e as "Rolinhas". Em Dores da Boa Esperança, onde nasci, eram os "Ratos" e os "Queijos". Os nomes diziam tudo. Ratos querem mesmo é comer o queijo. E o queijo quer mesmo é se colocar de isca na ratoeira para pegar o rato. [...] Como já disse, os eleitores nada sabiam dos programas de governo nem prestavam atenção nas promessas que eram feitas pelos chefões. Sua relação com seus partidos não era ideológica. Nada tinha a ver com a inteligência. Eles já sabiam que política não se faz com razão. Ganha não é quem tem razão. Ganha quem provoca mais paixão. O entusiasmo que tomava conta deles era igualzinho ao entusiasmo que toma conta do torcedor no campo. [...] Naqueles tempos o entusiasmo não vinha nem da ideologia nem do caráter dos coronéis. O que fazia o sangue ferver era o símbolo : "Eu sou Rato", "Eu sou Queijo". Corria o boato de que coronel Sigismundo, fazendeiro, chefe dos "Ratos", usava jagunços para matar seus desafetos. Não surtia efeito. Era mentira deslavada dos "Queijos" . Corria o boato de que o doutor Alberto , médico rico, chefe dos "Queijos", praticava a agiotagem. Mentira deslavada dos "Ratos". Os chefões , na cabela dos eleitores, eram semideuses , padrinhos , sempre inocentes. O que dava o entusiasmo era o campeonato. Quem ganharia ? Os "Ratos" ou os "Queijos"? Quem ganhasse a eleição seria o campeão, dono do poder, nomeações dos afilhados, até a próxima... Mais de oitenta anos se passaram. Os nomes são outros. Mas nada mudou. Política é a mesma paixão pelo futebol decidindo o destino do país. Os torcedores se preparam para a finalíssima entre os "Ratos" e os "Queijos". É como era na cidadezinha de Dores da Boa Esperança , onde nasci 73 anos atrás..."

-Alves, Rubem. Os "ratos" e os "queijos"...Folha de S.Paulo, 19 set. 2006. Cotidiano, p. C2.


A "Revolução" de 1964


 A chamada "revolução" de 1964, desencadeada por um golpe liderado pelos militares que derrubou o governo constitucional de João Goulart , foi na verdade uma contrarrevolução. Os movimentos sociais (de trabalhadores do campo e da cidade) vinham se organizando gradativamente desde 1960 e estavam conquistando muitos direitos. Isso significa uma mudança importante no Brasil. Não havia a possibilidade de uma revolução que transformasse radicalmente o sistema político e econômico , mas houve um grande avanço na participação dos setores populares na condição dos destinos do país. Isso não era interessante para os grandes proprietários do campo, nem para os industriais das cidades , nem para as empresas estrangeiras instaladas no Brasil. Essas forças , então, se organizaram e , com militares conservadores e apoiados por uma parte da classe média , que temia a presença das "classes perigosas" e do "comunismo" na cana política , propiciaram o golpe militar de 1¤ de Abril de 1964. Os militares reprimiram intensamente todos os movimentos populares e , depois , estabeleceram a censura aos meios de comunicação. Gradativamente retiraram uma série de direitos dos trabalhadores e ampliaram muito a presença do capital estrangeiro no Brasil. No final do período de ditadura militar , a inflação no Brasil era maior do que em 1964 e configurou-se uma desigualdade social nunca vista. Além disso, foi contraída uma dívida externa gigantesca , o que colocava o país nas mãos dos grupos financeiros internacionais. Entretanto , nesse período ditatorial, o país se modernizou , pois foram ampliadas as bases industriais, que desde a década de 1950 já eram internacionalizadas. Desenvolveu-se uma infraestrutura na área de energia e transportes e alterou-se profundamente a agricultura nacional , transformando-a em uma atividade capitalista significativa. Com essas medidas , criaram-se as bases para que houvesse a presença capitalista em todos os setores da sociedade , mesmo que isso significasse a marginalização da maior parte da população , tanto econômica quanto política e socialmente. Mas a grande mudança ocorreu no modo de vida da população urbana, que teve enorme crescimento. Essa mudança, ocasionada pela produção em massa dos mais diversos artigos industriais, como alimentos , roupas , eletrodomésticos e automóveis , foi coroada pela expansão das comunicações telefônicas, mas principalmente pela presença marcante da televisão , que se expandiu para quase todo o território nacional e , de alguma forma , criou novos comportamentos e valores. Muitos autores, desde então, caracterizam a mudança social no Brasil como "modernização conservadora", pois ocorre sempre por meio do Estado , ou seja, de cima para baixo e , na maioria dos casos, sob controle deste.